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quinta-feira, abril 24, 2008
U23D
A minha teoria pessoal sobre os U2 - de quem já fui fã incondicional,há muitos anos - é que tiveram um orgasmo criativo de tal intensidade com Achtung Baby e Zooropa que tudo o que tem acontecido desde então é um longo período de cansaço e recuperação pós-orgasmo. Sim,eu acho que eles ainda estão caídos para o lado nesta altura e a cada disco mantenho a esperança de que os indivíduos recuperem o entusiasmo. Mas,lamento dizê-lo,para mim isso ainda não aconteceu.Os U2 actuais servem-me tanto como o Sting actual:são uma pálida imagem de glórias passadas,criam canções indiferenciadas e banais,estão placidamente encostados ao estatuto,gerindo a sua marca sem sobressaltos.Eu sei que isto vai provocar grande revolta por estas bandas,mas é o que eu sinto:os U2 de hoje são,infelizmente,uma seca.Lá pelo meio têm uns fogachos de inspiração(Vertigo,por exemplo,é um grande single),mas estão acomodados.Recordo com saudade os tempos em que se ousava fazer um Numb, um Daddy's Gonna Pay For Your Crashed Car... E nem é preciso ir tão longe: os tempos em que as baladas - como One ou So Cruel - pareciam sair do coração,das entranhas,e não de uma máquina.
O concerto que vemos em U23D é um concerto acomodado: previsível, mecânico, preguiçosamente andando aos restos de grandes concertos anteriores (as imagens de Martin Luther King durante Pride;as mensagens escritas à Zoo TV durante The Fly),quatro bons músicos despachando serviço com a competência que se lhes reconhece mas zero de inspiração e criatividade.A realização de Catherine Owens e Mark Pellington também não tem nada que aproxime U23D de filmes-concerto dignos de ser chamados de Cinema: este filme está longíssimo de coisas como Stop Making Sense dos Talking Heads e de Jonathan Demme,A Última Valsa dos The Band e de Martin Scorsese ou mesmo da anterior incursão dos U2 pelo cinema,Rattle and Hum,de Phil Joanou (que,ao contrário do que alguns críticos teimam em dizer,era um excelente rockumentário).A verdade é que, se retirarmos o efeito 3D a U23D teríamos um bem feitinho mas banal concerto filmado para TV,um daqueles que a RTP-2 passa às vezes nas tardes de fim-de-semana,para encher.
Dito isto, saúdem-se os verdadeiros mestres de U23D:a equipa técnica que assegurou o efeito tridimensional ao filme e que faz de uma conjunção de coisas banais,85 minutos de entretenimento divertido.Estão longe os tempos em que a 3D transformava pessoas em bonecos de papel recortado:neste filme há profundidade,volume e uma incrível atenção ao detalhe: nas cenas de multidão é particularmente espantoso que cada elemento do público pareça ter sido trabalhado individualmente (e acreditem que,naquele estádio, há muita gente).E é divertido andar pelo meio da banda e quase levar com um dedo de Bono num dos olhos. Tão divertido que U23D acaba por estimular os espectadores mais atrevidos a cantar as letras dos clássicos,despertando um certo espírito de comunidade na sala de cinema (recorde-se que,nos anos 80,quando Rattle and Hum estreou, havia fãs dos U2 a entrar no Tivoli munidos de cartazes e bandeiras,como se estivessem a entrar num estádio).
Qualquer um dos DVDs disponíveis no mercado com concertos dos U2 (nomeadamente os das digressões Zooropa e Popmart) é muito mais espectacular do que o concerto de U23D. E nem precisam do efeito 3D para isso. Mas para hora e meia de relaxado escapismo musical e tecnológico, U23D cumpre.
sexta-feira, abril 11, 2008
We Own The Night
We Own The Night -que em Portugal vai chamar-se Nós Controlamos a Noite -é um operático melodrama policial e familiar transpirando clássico por todos os poros.Mais: movendo-se em águas parecidas às de The Departed (Joaquin Phoenix é um homem dividido entre os dois lados da lei),o filme de James Gray (realizador de Little Odessa) consegue ser superior ao de Scorsese,que era bem bom embora não oferecendo surpresas de maior a quem conhecia os filmes orientais que o inspiraram (a saga Infernal Affairs).
We Own The Night é um dos filmes mais intensos,requintados,elegantes e brutais que Hollywood pariu nos últimos anos e Gray narra e filma a sua história com uma confiança,um estilo e uma sinceridade tal que até consegue fazer com que o uso da câmara lenta ainda pareça cool.A agreste noite nova-iorquina dos 80s está recriada com detalhe e a história,embora passada no submundo do crime,prefere dissertar de forma pungente sobre os laços de família do que abusar de tiroteios e sequências de acção(embora as haja,curtas,brutais e concentradas,com direito a um espantoso climax num campo de milho).A mim,fã devoto de dramas policiais de outros tempos,como Serpico,We Own the Night encheu-me as medidas.E o trio de actores principais(Joaquin Phoenix,Mark Wahlberg e o grande,grande Robert Duvall) merecia nomeações e prémios que nunca mais acabam...
quinta-feira, abril 03, 2008
terça-feira, abril 01, 2008
Dan In Real Life
Para mim, Dan in Real Life é um dos filmes mais aguardados do ano. Sou grande fã do argumentista e realizador Peter Hedges, cujos About a Boy e Pieces of April são delicados, divertidos e muitíssimo bem escritos pedaços de vida (na verdade, About a Boy começava já por ser muitíssimo bem escrito enquanto livro do Nick Hornby, mas o argumento de Hedges está uma rica adaptação). Uma das razões porque aguardo Dan in Real Life com tanta expectativa é também porque Steve Carell é o actor principal. E se há género que Carell faz bem é este tipo de comédia dramática de espírito indie (não é por acaso que há quem diga que Dan in Real Life é o Little Miss Sunshine deste ano).
Não fazia ideia é que, tal como Badly Drawn Boy fez em About a Boy e os Magnetic Fields em Pieces of April, Lerche tinha sido o cantautor escolhido para compôr um score de canções e pequenos instrumentais capazes de dar ao ambiente sonoro do filme uma identidade própria, muito consistente. Gosto quando isso acontece, mais do que quando se constrói uma banda sonora com base em cantigas previamente gravadas e que entram mais ou menos aleatoriamente na fita, a encher chouriços e a fazer a história andar, preguiçosamente, para a frente. Ainda não vi Dan in Real Life, mas pelo disco da banda sonora, parece-me que a função de Lerche é, de facto, a mesma de Damon Gough e de Stephin Merritt nos anteriores filmes escritos por Peter Hedges: fazer da banda sonora uma personagem.
Sondre Lerche é um grande escritor de canções, algures entre Elvis Costello, a-Ha e Burt Bacharach, e as músicas que assina para Dan in Real Life são uma delícia, como se pode ver por To Be Surprised, o tema principal do filme, que ele foi há tempos cantar ao programa do David Letterman.
Não fazia ideia é que, tal como Badly Drawn Boy fez em About a Boy e os Magnetic Fields em Pieces of April, Lerche tinha sido o cantautor escolhido para compôr um score de canções e pequenos instrumentais capazes de dar ao ambiente sonoro do filme uma identidade própria, muito consistente. Gosto quando isso acontece, mais do que quando se constrói uma banda sonora com base em cantigas previamente gravadas e que entram mais ou menos aleatoriamente na fita, a encher chouriços e a fazer a história andar, preguiçosamente, para a frente. Ainda não vi Dan in Real Life, mas pelo disco da banda sonora, parece-me que a função de Lerche é, de facto, a mesma de Damon Gough e de Stephin Merritt nos anteriores filmes escritos por Peter Hedges: fazer da banda sonora uma personagem.
Sondre Lerche é um grande escritor de canções, algures entre Elvis Costello, a-Ha e Burt Bacharach, e as músicas que assina para Dan in Real Life são uma delícia, como se pode ver por To Be Surprised, o tema principal do filme, que ele foi há tempos cantar ao programa do David Letterman.
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